segunda-feira, 12 de agosto de 2013

O OUTRO



Roberto chegou mais cedo em casa naquele dia. Sem qualquer aviso, sem motivo aparente. Nada dissera no escritório, qualquer justificativa que fosse, pegou suas coisas e saiu. Há meses a dúvida lhe corroía a paz, debilitava seu raciocínio e comprometia suas funções. Qualquer momento de distração e “zás”, seus pensamentos estavam concentrados no que ela estaria fazendo em sua ausência! Tentou corrigir a si mesmo, advertir sua consciência da tolice que estava cometendo em duvidar daquela mulher, a mulher de sua vida! Ela que havia se apaixonado por ele no instante em que soube de sua existência, que suportava sua melancolia, seus atrasos, seus hábitos irritantes (como chupar o osso da cocha da galinha emitindo um estalo com a língua entre os dentes), suas dicotomias. E tudo sem exigir nada em troca! Aquela mulher era a mulher! Mas há alguns meses seu comportamento estava mudado. Ele percebeu no dia em que saíra sem avisar e ela não o interrogou quando voltou para casa. Nenhuma pergunta sequer. Ele que já tinha pensado em como justificar-se sem lhe magoar, sem ser rude, mas ela nem quis saber. Algo mudou! Passou a perceber que em alguns dias quando voltava do trabalho a encontrava com aquele sorriso de Monalisa. Sorriso misterioso, como a esfinge que diz a Édipo: “Decifra-me ou te devoro”. E a dúvida se instalou em sua mente: Teria ela encontrado outro homem? Passou a ficar em casa nos finais de semana. Nada de futebol com os amigos, nada de cervejas ou conversas animadas. Do trabalho para casa e de casa para o trabalho. Enquanto ele estava em sua companhia tudo era perfeitamente normal, mas nas terças e quintas ele voltava e via aquele sorriso! Roberto não suportava mais! Hoje seria o dia de esclarecer tudo e se ele estivesse errado (e com a graça do poderoso Deus estaria) pediria desculpas solenes e ambos iriam rir disso no sofá da sala, assistindo a novela das oito. Abriu a porta silenciosamente e avançou em direção ao quarto dela. Ninguém. Então ouviu risos na cozinha. Risos! Havia um homem ali. Traidora! Como pôde fazer isso? Como? Ele ia dar um escândalo, dizer verdades e distribuir socos em quem profanou o santuário do seu lar. Ao chegar na cozinha não acreditou no que viu. Seu Manoel, o simpático velhinho, vizinho de longa data, à mesa tomando café em frente a ela, suas mãos velhas e enrugadas sobre as dela, denunciando sua intimidade! Ela então o viu, ficou assustada sem saber o que dizer e o que saiu de sua boca foi uma frase clichê: _ Eu posso explicar! Não é isso que você está pensando! Roberto não precisava de explicações. “Eu vi tudo, mamãe! Não há mais espaço para mim nessa casa. Vai ser melhor para nós dois”. E foi arrumar suas malas. Ela o seguiu, como toda mãe faria. Ele continuou, inexorável. Dona Maria quis chorar, mas se conteve. Seu bebê ainda voltaria, ela sabia disso. Na cozinha Seu Manoel estampava um sorriso de triunfo. Dona Maria ainda abençoou o filho e disse que poderia voltar quando quisesse. Pobrezinho, como vai viver sem mim? Roberto tinha apenas trinta e cinco anos. Uma criança aos olhos da mãe.

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