terça-feira, 6 de agosto de 2013

Serpentes não voam.


Serpentes não voam.


Serpentes não voam, não é de sua natureza.

E talvez por isso rastejem. Ou, além disso, rastejem por não ter pernas.
Ou, além disso, por não suportar olhar o céu, passaram a viver sempre mais próximo do chão. E vivendo com o ventre, o coração e o pensamento no chão, passaram a rastejar. Ou, além disso, começaram a rastejar por não acreditar em mais nada, e sem acreditar em mais nada, passaram a se sentir inferiores, e, sentindo-se inferiores, não puderam mais caminhar, e sem poder caminhar, perderam as pernas.

Talvez sem as pernas as serpentes não quisessem mais produzir nada. E, talvez por isso, tenham perdido também as mãos. E perdendo pés e mãos e sendo incapazes de voar, elas passaram a odiar todos que podiam andar com as próprias pernas, produzir com as próprias mãos, olhar para o céu e voar. E odiando a todos, incluindo sua incapacidade de andar, produzir, olhar adiante e voar, elas passaram a produzir veneno, e esse veneno, por ser produto de inveja, autopiedade e ódio, passou a ser mortal. 

Seres humanos também não voam. Mas por caírem e levantarem, aprenderam a andar com as próprias pernas. Por admirar a beleza e sentir-se triste com a miséria, a fome e a dor, sentiram o desejo de transformar a realidade, então, aprenderam a produzir com as próprias mãos. Por acreditar em mudanças, desenvolveram a fé e a esperança, e foram capazes de olhar para o céu. Vendo o imenso céu azul, infinito do tamanho do coração de uma mãe ou de uma criança, mesmo sem poder voar criaram asas, e com essas asas que cresceram em seus corações e em suas mentes, foram capazes de voar cada vez mais alto.

As serpentes continuaram como eram e não suportaram que seres humanos fossem capazes de sonhar. Não quiseram mudar porque odiar era mais fácil e já estavam acostumadas a produzir veneno dentro delas mesmas. Então decidiram sempre tentariam envenenar mentes, incentivar medos, destruir projetos e perseguir sonhadores. 

Um velho certa vez me contou que as serpentes põe ovos invisíveis no chão e que nós, ainda quando engatinhamos, os engolimos sem que ninguém veja. Eles estão em todos nós, mas só conseguem gerar novas serpentes se produzirmos veneno em nós mesmos.

Então mesmo quando estou muito triste, como hoje, olho para o céu e penso em tudo que há de bom e belo nessa vida. Faço uma prece silenciosa, peço fé e esperança e deixo meu coração voar. Não é da minha natureza produzir veneno ou me transformar em serpente.

Emerson Luiz 

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